
Na verdade, geralmente quer dizer mais do que isso. Não ser egoísta implica não se fazer o que se quer, desistir de suas próprias vontades em benefício dos que detêm autoridade. “Não seja egoísta”, em última análise, tem a mesma ambigüidade que possui no calvinismo. Além de seu sentido óbvio, quer dizer “não ame a si mesmo”, mas submeta-se a algo mais importante do que você, a um poder exterior ou a sua interiorização, o “dever”. “Não seja egoísta” se transforma em uma das mais poderosas ferramentas ideológicas para suprimir a espontaneidade e o livre desenvolvimento da personalidade. Sob a pressão desse slogan, pede-se à gente todo sacrifício e submissão completa; somente são “desinteressados” os atos que não atendem ao indivíduo, mas a alguém ou a algo a ele estranho.
Esse quadro, devo repetir, é de certa forma unilateral. Assim como ocorre com a doutrina de que não se deve ser egoísta, também há muita propaganda da tese oposta na sociedade moderna: tenha em mente suas vantagens, aja de acordo com o que for melhor para si; fazendo assim você também estará agindo para o maior proveito de todos.
Com efeito, a idéia de que o egoísmo é a base do bem-estar geral constitui o princípio sobre o qual se ergueu a sociedade competitiva. É de estarrecer como dois princípios aparentemente tão contraditórios puderam ser ensinados lado a lado na mesma cultura; quanto ao fato, porém, não há dúvida. Uma conseqüência dessa contradição é a confusão do indivíduo. Dividido entre essas duas doutrinas, ele fica seriamente inibido para integrar sua personalidade. Essa confusão é uma das fontes mais expressivas da perplexidade e atarantamento do homem moderno.
A doutrina de que o amor a si mesmo é idêntico a “egoísmo” e uma alternativa para o amor a outros invadiu a Teologia, a Filosofia e o ideário popular (…) Acodem as seguintes perguntas: (…) será o amor a si próprio o mesmo fenômeno que o egoísmo, ou serão eles opostos entre si? Outrossim, será o egoísmo do homem moderno uma preocupação consigo mesmo como indivíduo com todas as suas potencialidades intelectuais, emocionais e sensuais? Não terá ele se convertido em um apêndice de seu papel sócio-econômico? Será o egoísmo idêntico ao amor-próprio ou não será ele causado pela própria falta deste? (…)
Egoísmo e amor-próprio, longe de serem idênticos, são de fato opostos. A pessoa egoísta não ama a si mesma demasiadamente, mas muito pouco; com efeito, ela se detesta. Essa falta de ternura e desvelo por si mesma, que é apenas uma expressão de sua falta de produtividade, deixa-a oca. Ela forçosamente se sente infeliz e ansiosamente preocupada em agarrar com avidez as satisfações da vida que ela se impede a si mesma de conseguir. Parece inquietar-se por demais consigo, mas na verdade o que faz é tão só uma malograda tentativa de disfarçar e compensar sua deficiência para cuidar de seu verdadeiro eu. Freud alega que a pessoa egoísta é narcisista, como se tivesse retirado seu amor dos outros e o tivesse voltado para a própria pessoa. É fato que os egoístas são incapazes de amar a outros, mas não são tampouco capazes de amar a si mesmos.
ERICH FROMM
2 comentários:
Olá Outsider,
Saudações de um outro... outsider...
Achei seu blog por acaso e é como se eu mesmo houvesse escrito estes posts...
Tambem tenho um blog onde "questiono os paradigmas da sociedade atual" Tendo a liberdade como a questão principal do ser humano.
Já faz algum tempo que não posto
algo novo por absoluta falta de tempo, mas em breve voltarei a postar.
De qualquer forma é muito bom poder falar com alguem em sua "própra lingua", que entenda o que você entende, pensa como você pensa, enxerga o mundo como você enxerga, é bom saber que não estamos sós neste mundo, talvez sejamos uma minoria, mas há outros como nós.
Obrigado pelos seus posts,pelo seu blog, por expressar o que muitas vezes não conseguimos, e ser a voz de nossas consciências.
Continue sendo... um outsider !
DE OUTSIDER PARA OUTSIDER
O sonho de Lutero...
O significado do termo evangélico...
In to the Wild...
São posts que li, e é como se eu tivesse escrito, cheguei mesmo a discutir estes assuntos com amigos meses antes de conhecer o blog,
particularmente In to the Wild foi um dos melhores filmes que assisti, e a cena escolhida para o post é em minha opinião a melhor de todo filme, na verdade gostaria de estar lá, a melhor definição de liberdade,
Bom, mais uma vez meus parabens, se quiser visite meu blog, me adicione, vamos trocar umas idéias,
Até mais,
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